[PREMIERE] Devise: “tudo nosso é na raça, desde o início”

[PREMIERE] Devise: “tudo nosso é na raça, desde o início”

Não é possível falar da Devise sem abrir mão da objetividade jornalística. Sim, sendo fã e considerando o frontman Luís Couto um integrante permanente do meu pequeno, porém existente, grupo de amigos, fica difícil não chover no molhado quando se trata de um novo álbum, ou mesmo um novo single como é o caso dessa versão acústica de “De quanto em quanto tempo?”.

Acústica porque não há formato mais indicado diante da famigerada pandemia, que obrigou os 4 integrantes da Devise a se separarem, embora se unam em gravações à distância (comprovem com essa versão memorável de “Bitter sweet Symphony” feita pelos caras). De acordo com Luís, “De quanto em quanto tempo?” foi a música mais difícil de “despir” de sua produção oficial:

Devise por Marina Jacome

“Essa foi a mais desafiadora das três versões acústicas que lançamos. Considero a versão original de “De Quanto em Quanto Tempo?” o trabalho mais denso, pesado e experimental que já fizemos. Tem sampler, muito sintetizador, a participação dos vocais característicos do Lucas (Pense) e um riff principal que define muito a música. Como seria fazer um acústico disso? Então abrimos mão de todas essas coisas. Foi quase que como reescrever a música. De todo jeito, experimentamos bastante nessa também. Chocalho na bateria, um baixo meio “lazy” que adoro, uma afinação aberta no violão com um som meio de dobro, meio de guitarra, slide o tempo todo. A gente foi feliz nesse arranjo. Um britpop que encontrou o Jesus and Mary Chain, dando um alô pra alguma coisa meio blues”

Luís Couto – Devise

Não se espante se você também tiver a impressão de que a faixa foi extraída da gravação ao vivo (rara) “The Dream we have as children” de Noel Gallagher, além do menos óbvio “Psychocandy” do The Jesus and Mary Chain. Afinal, Devise é uma das poucas, senão a única, que tem como bandeira o britpop, saudosa tendência de meados dos anos noventa que reuniu expoentes como Oasis, Blur, Supergrass, Verve e Suede. Com canções em português, a Devise traz de volta toda a paixão que essas bandas até então exalavam no palco, cortesia não só de Luís, mas do baixista Bontempo, Baterista Daniel e do segundo guitarrista Mike. Esse é o chamado street rock, ou street brit pop da Devise, que ainda tem o mérito de congregar os músicos de BH, conforme analisa J. Horsth, o caricatural frontman da Young Lights: “Luís é um super network guy que todo mundo ama, o resto dos meninos também, é sempre foda ver, porque todos músicos estão na correria e é bom reunir“, afirma.

Apesar do reconhecimento em forma de prêmios, convites para festivais (alguns), releases publicados em blogs badalados e faixas tocadas em rádios consideradas “comerciais”, entre outros, a Devise ainda hoje padece do estigma “Skank”. Ou seja, volta e meia, todas as bandas mineiras que fazem rock esbarram no que eu considero a maior barreira para alçar voo próprio: a comparação. O que, no entanto, o vocalista-guitarrista-compositor Luís Couto encara com naturalidade.

RC – A Devise tem galgado passos importantes nos últimos anos, tocando em rádios comerciais e sendo reconhecida publicamente até mesmo por Samuel Rosa. O Skank, por ser também uma banda mineira na qual vocês se espelha, tem alguma influência por trás dos bastidores nessa jornada?

Instagram Devise

LC – Nessas questões eles não têm nenhuma influência. A gente fica extremamente feliz por eles reconhecerem o nosso trabalho e somos gratos demais por isso. Pensa? São seus ídolos falando que gostam do que você faz! Você se inspirou neles. Isso é incrível! Uma das melhores coisas que podem acontecer na vida de um artista. E ainda acaba rolando uma troca de poder conversar e etc. Aprendemos muito. Mas a influência deles no nosso trabalho fica na referência que eles são pra gente e nesse reconhecimento, que é recíproco. Nos bastidores corremos “sozinhos”.  No sentido de não termos equipe, produtor, empresário, banda amiga ou alguém que abra essas portas. Tudo nosso é na raça, desde o início. Levando sempre 99 NÃO pra cada SIM. Só que a gente não liga pra esse tanto de “não”. Ou melhor, liga um pouco em algumas situações, mas não desiste. Persistir é importante. No rock, nem se fala.

Devise por Lívia Rios

RC – Então você não é o cara cheio da grana que investe na Devise como um hobby, pelo que eu entendi.

LC – A banda se banca, quando, muitas vezes, a gente não tem que se virar pra completar alguma coisa. O que é foda porque já temos que ralar demais nos nossos empregos “formais”. E além dessa vontade que a gente tem, contamos com pessoas que acreditam muito no trabalho. São nossos amigos que estão nas produções de audio/video com a gente, pessoas que estão na imprensa e nos valorizam, enxergam valor (como você, que acabou virando nosso amigo), as casas de show que éramos frequentes quando podíamos tocar e uma galera curte o trampo, que tá sempre lá na linha de frente no palco e agora apoiam muito também nas redes sociais. Então qualquer um desses espaços aí, seja em alguma coisa da mídia, rádio ou numa playlist do Spotify é pelo trabalho mesmo, não tem uma pessoa facilitadora por trás da parada toda. Não acho que é errado ter. Seria ótimo, inclusive, mas nós não temos isso. 

Devise por Flavio Charchar

O que a cena de BH tem a dizer sobre a Devise?

Eu acho que a Devise tem uma influência grande em agitar o rock mineiro. Além das baladas com muita melodia, ir à um show deles é como ir em churrasco de família, a gente se sente em casa. É sempre muito gostoso!

Verônica Magalhães – cantora/compositora – e primeira-dama do rock mineiro

Poucas bandas conseguem transitar tão bem entre o underground e aquilo que muitas vezes é chamado por aí de música mineira. Devise pra mim consegue, em altíssimo nível, transitar entre o rock britânico e o clube da esquina, entre o underground e as lindas baladas que tocam nas rádios. Esse papel na cena é para poucos.

Rhodes Madureira – Produtor/Videomaker/Músico – e adestrador nas horas vagas

Devise é um exemplo de força, dedicação, talento e resistência para todas as bandas e pessoas que acompanham a cena. Além disso, Luís, Mike, D2 e Bontempo são figuras incríveis e queridas por todos. Essa mistura de bons discos, bons shows e uma postura invejável perante outras bandas e tudo que envolve a cena, tornam praticamente impossível não admirar a carreira que esses caras vêm construindo. Eu não conheço uma pessoa em BH que não admira e respeita o trabalho da Devise. E nem quero conhecer.

Matheus Marinho – Dear Trouble, Me Indique uma Banda – e autoproclamado fã n1)

Além de terem contruibuido para a união de artistas de BH, Bom Despacho e São João Del Rei, a Devise é uma das bandas que tem um trabalho independente mais ativo e agregador dentro do cenário mineiro

Bruno Bentes- Batera da Radiotape – e produtor mais descolado de BH

O papel da Devise para o underground mineiro é fundamental, pois é uma daquelas bandas que são capazes, em todos os aspectos, de trazer a tona novamente o rock a um papel de protagonismo no cenário nacional (e até mesmo internacional, nesse mundo onde toda informação circula tanto e tão rápido). Fui cativado de prima pelas composições, a sonoridade, os timbres, a verdade do trabalho, e a dedicação a cada detalhe do trabalho. Sou grande fã, e um torcedor pelo sucesso da banda.

Eduardo Ladeira – Frontman Lobos de Calla – agora em versão heavy metal do Senhor

A Devise foi uma das primeiras bandas que me abraçaram no cenário musical de BH quando cheguei na cidade. Sempre foram um grande ponto de apoio e me ajudaram muito a me sentir parte da cena belorizontina. É uma banda que admiro demais, não só pelo trabalho, mas pela postura que eles tem, diante dos fãs e diante dos parceiros músicos da cidade.

Arianne Ruas – cantora/compositora – e youtuber folk

Acredito que a Devise é um ponto de encontro musical na cena underground. Ao mesmo tempo em que as músicas têm melodias prontas pra estourar no mainstream, elas têm o DNA do rock alternativo nas letras, na sonoridade e na energia. Essa mistura dá um longo alcance pra música dos caras, então não é por acaso que eles já têm público fiel e sempre ganham novos adeptos nos shows do underground mineiro.

Raphael Jardim – Frontman da banda OUS – e sideman de luxo

Com certeza (a Devise) é um expoente nesse cenário, é uma banda que conseguiu abrir diversas portas para o underground em lugares que talvez nem imaginariamos que seria possível.

Luís Borges – Baterista da Evil Matchers, co-criador do “No meio do Caos” – e barbershop model

Eu acho que a Devise sempre traz uma reunião, é tipo um culto toda vez que eles tocam, são várias pessoas de todos os cantos da música que vão aos shows e a gente acaba congregando.

J. Horsth – Frontman da Young Lights – e galã dos realities

Bônus: Uma crônica sobre a Devise por Breno “Osnato” Assis, da Roboto

Conheci a Devise já devidamente informado de sua importância na cena autoral. E, em mais uma dessas peripécias em conjunto com meu parceiro de ciladas Bernardo, ativei a cara de pau suficiente para convidá-los para uma de nossas iniciativas de shows underground. A negativa já estava nos planos, mas fui vergonhosamente surpreendido pelo retorno positivo. Ao conhecer pessoalmente a banda, pude entender melhor porque o “sim” seria a resposta esperada.

São pessoas de uma simplicidade ímpar, capaz de desarmar possíveis preconceitos em relação a bandas que já possuem o reconhecimento que a Devise merecidamente já alcançou. Além de dominarem qualquer que seja o palco de forma incrível, sabem muito bem utilizar as excelentes referências musicais que carregam. E arrisco dizer que é a mais mineira das bandas de BH, tanto no bom e hospitaleiro jeito mineiro que carregam quanto em relação ao “espalhamento” geográfico dos caras, unindo ao menos as cidades de Belo Horizonte, Bom Despacho, Divinópolis e São João Del Rei em uma única banda.

Não espere nada blasé da Devise. A banda é capaz de nos oferecer sons de excelente qualidade, transmitindo sempre muita energia. Impossível não cantarolar as letras junto ao Luís já na primeira audição. E não durma no ponto, pois a Devise não para: eles entenderam o espírito do tempo e se mantém muito ativos, com o lançamento constante de singles e vídeos, para nosso deleite.

E agora, escute em primeira mão “De quanto em quanto tempo?” (acústico) da Devise:

Ficha técnica:

Foto: Paula Nardy

Capa: André Greco e João Ferreira

Composição: Luís Couto/Fernando Pádua/Pedro Dias

Gravação: em casamix/master: Bruno Retes

Confira a Devise no Rock Cabeça Sessions:

E então? O que achou do novo single acústico da Devise? Deixe seu comentário aí embaixo! Participe!

Marcos Tadeu

Marcos Tadeu

Jornalista, idealizador e apresentador do Rock Cabeça na 100,9 FM, Rádio Inconfidência FM (MG) desde 2016. Acima de tudo, um fã de rock gringo.